21 de jan. de 2016

CBF adotará sistema que poderá eliminar clubes pequenos

Como pano de fundo da obra prima de Wendell Lira, vencedor do Prêmio Puskas, está o Goianésia, clube até então pouco - ou nada - conhecido que está sob risco de ficar para a posteridade apenas. Um grupo de estudos montado na CBF visa implementar gradativamente, a partir de 2017, o Sistema de Licenciamento de Clubes com o objetivo de padronizar a profissionalização. De acordo com a Federação Nacional de Atletas Profissionais de Futebol (FENAPAF), o país tem 900 clubes que se dizem profissionais, número que, com o caderno de encargos, poderá cair para 250. 
"Tem clube que não tem pão com manteiga. Outros cobram até para o atleta jogar...Com o sistema de licenciamento, não se enquadrou, está fora. Vai disputar campeonato amador", afirmou o presidente da FENAPAF e também do Sindicato dos Atletas Profissionais de São Paulo, Rinaldo Martorelli.
 
O caderno exigirá estrutura profissional, o que parece beabá, mas não é. Desde local de treino, vestiários, médicos, comprovação de receitas, cumprimento de obrigações trabalhistas, pagamentos de salários, a participação num calendário anual - atualmente, muitos clubes jogam menos de um semestre no ano. A CBF quer implantar algumas exigências para 2017 sem a urgência dos sindicatos. Entre os responsáveis na CBF, há o temor de que os clubes não consigam se adequar principalmente em relação ao centro de treinamento e às categorias de base. No ano passado, a entidade recebeu representantes da Uefa, responsáveis pela criação das regras na Europa. No Brasil, o grupo de estudo é formado por representantes das federações, clubes e diretores da CBF.
 
O excessivo número de clubes dá a sensação de emprego, mas, na verdade, põe um tapete sobre o porão do futebol brasileiro. Wendel Lira, muito provavelmente, deixará a base dramática da pirâmide salarial: 85% dos jogadores recebem até dois salários-mínimos por mês. No topo, estão 2,25% com mais de 20 salários. 
 
"Fiscalizamos clubes e nos deparamos com cenas inacreditáveis. Clubes sem campo, jogadores trocando de roupa no gramado por falta de vestiário, sem receber salários... A realidade do futebol brasileiro é do sonhador que chega no clube pequeno com 20 anos, peregrina até os 36 anos e deixa o futebol sem profissão, sem dinheiro, sem rumo. É um sonho mentiroso", disse o presidente do Sindicato dos atletas Profissionais do Rio de Janeiro, Alfredo Sampaio.
 
Ex-jogador de clubes pequenos, Alfredo sentiu na pele a dificuldade. Mas sem jamais largar o estudo. Preocupado na mesma medida que indignado, ele encabeça o projeto de licenciamento. Além da formatação, levou a realidade à CBF, ao Supremo Tribunal Federal e à Federação de Futebol do Rio de Janeiro. Uma briga de longa data. Atrás de votos, as entidades abrem a guarda para receber apoio. A qualquer custo, um clube sem a mínima estrutura tem poder de voto numa eleição a ponto de ser decisivo. Explica-se em parte o continuísmo em muitas federações estaduais e até a nacional.
 
"Falei com o Rubinho (presidente da Federação de Futebol do Rio de Janeiro). Não pode ir atrás de voto de clube da Série C. Essa competição não deveria nem existir. O clube não tem médico. É uma vergonha. Na CBF, a proposta do licenciamento só andou depois da saída do Ricardo Teixeira... Mostrei em Brasília o que se passa no futebol brasileiro, longe dos holofotes", afirmou Sampaio.
 
"Ao fazer a acrobacia para o golaço, Wendell Lira deu um salto profissional que muitos sonham. No Brasil, estimam as entidades, apenas 40 clubes são capazes de abrigar jogadores com dignidade. A equação entre mão de obra excessiva e pouco qualificada, poucos clubes bons e muitos sem estrutura é igual a sonho mais futuro nada promissor. O futebol é um cone ao contrário. Muitos entram, poucos saem", concluiu Alfredo Sampaio.
 
Guto Seabra
Colaboração para o UOL Esporte, no Rio de Janeiro
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